Sensação é uma coisa, e felicidade é outra. A sensação está sempre indo atrás de mais sensação, em ciclos mais e mais amplos. Não há fim para os prazeres da sensação; eles se multiplicam, mas sempre há insatisfação na sua realização; há sempre o desejo por mais, e a demanda por mais não tem fim. Sensação e insatisfação são inseparáveis, pois o desejo de mais mantém os dois juntos. Sensação é o desejo de mais e também o desejo de menos. No próprio ato de realização ou sensação, nasce a demanda por mais. O mais está sempre no futuro; é a eterna insatisfação com o que houve. Há conflito entre o que houve e o que haverá. Sensação é sempre insatisfação. A pessoa pode vestir a sensação com trajes religiosos, mas ela é ainda o que é: uma coisa da mente e uma fonte de conflito e apreensão. As sensações físicas estão sempre pedindo mais; e quando são contrariadas, surge raiva, ciúme, ódio. Existe prazer no ódio, e a inveja é satisfatória; quando a sensação da pessoa é contrariada, encontra-se satisfação no próprio antagonismo que a frustração provocou.
Comentários sobre o viver; Vol. I; Capítulo 85; Sensação e Felicidade
Quando você está cônscio de que está feliz, existe felicidade? Quando existe felicidade, você está cônscio dela? A conscientização chega só com o conflito, o conflito da lembrança do mais. Felicidade não é a lembrança do mais. Onde há conflito, não há felicidade. O conflito está onde a mente está. O pensamento em todos os níveis é a resposta da memória, e assim, o pensamento invariavelmente gera conflito. Pensamento é sensação, e sensação não é felicidade. Sensações estão sempre em busca de gratificações. O fim é sensação, mas a felicidade não é um fim: ela não pode ser buscada. “Mas como podem as sensações chegar a um fim?” Findar a sensação é convocar a morte. A mortificação é apenas outra forma de sensação. Na mortificação, física ou psicológica, a sensibilidade é destruída, mas não a sensação. O pensamento que se mortifica está apenas buscando mais sensação, porque o pensamento em si é sensação. A sensação não pode dar fim à sensação; pode haver sensações em outros níveis, mas não existe fim para a sensação. Destruir a sensação é estar insensível, morto; não ver, não sentir cheiro, não tocar é estar morto, que é isolamento. Nosso problema é inteiramente diferente, não é? O pensamento não pode trazer felicidade; ele pode apenas recordar sensações, pois pensamento é sensação. Ele não pode cultivar, produzir ou progredir em direção à felicidade. O pensamento só pode ir em direção ao que ele conhece, mas o conhecido não é felicidade; o conhecido é sensação. Faça o que fizer, o pensamento não pode ser ou procurar felicidade. O pensamento pode apenas estar consciente de sua própria estrutura, seu próprio movimento; quando o pensamento faz um esforço para dar um fim em si mesmo, está apenas buscando ser mais bem sucedido, atingir uma meta, um fim que será mais gratificante. O mais é conhecimento, mas não felicidade. O pensamento deve estar cônscio de seus próprios caminhos, de suas sagazes ilusões. Estando consciente de si mesma, sem nenhum desejo de ser ou não ser, a mente chega a um estado de inação. Inação não é morte; é uma vigilância passiva na qual o pensamento está totalmente inativo. É o mais alto estado de sensibilidade. Quando a mente está inativa em todos os seus níveis, só então existe ação. Todas as ações da mente são simples sensações, reações a estímulos, influências, e não ação de fato. Quando a mente está sem atividade, há ação; esta ação é sem causa, e só então existe bem-aventurança.
Comentários sobre o viver; Vol. I; Capítulo 85; Sensação e Felicidade