O problema então é: É possível para uma mente que foi tão condicionada – educada em inumeráveis seitas, religiões, e todas as superstições, medos – se apartar de si mesma e, com isso, produzir uma nova mente? A velha mente é essencialmente a mente que está confinada pela autoridade. Eu não estou usando a palavra autoridade no sentido legal; mas com essa palavra quero dizer autoridade como tradição, autoridade como conhecimento, autoridade como experiência, autoridade como meio de encontrar segurança e permanecer nessa segurança, externa e internamente, porque, afinal, é isso que a mente está sempre buscando. – um lugar onde ela possa estar segura, sem perturbação. Tal autoridade pode ser a autoridade auto-imposta de uma ideia ou a chamada ideia religiosa de Deus, que não tem realidade para uma pessoa religiosa. Uma ideia não é um fato, é uma ficção. Deus é uma ficção; você pode acreditar nele, mas ele é ainda uma ficção. Mas para encontrar Deus você deve destruir completamente a ficção, pois a velha mente é a mente que é medrosa, que é ambiciosa, tem medo de morrer, de viver e de relação; e ela está sempre, consciente ou inconscientemente, buscando uma permanência, segurança.
J. Krishnamurti – O Livro da Vida
A maioria de nós está satisfeita com a autoridade porque ela nos dá uma continuidade, uma certeza, uma sensação de se estar protegido. Mas um homem que queira compreender as implicações desta profunda revolução psicológica deve estar livre da autoridade, não deve? Ele não pode considerar nenhuma autoridade, seja de sua própria criação ou imposta a ele por outro. E isto é possível? É possível para mim não confiar na autoridade de minha própria experiência? Mesmo quando rejeitei todas as expressões exteriores de autoridade – livros, professores, sacerdotes, igrejas, crenças – ainda tenho o sentimento de que ao menos posso confiar em meu próprio julgamento, em minhas próprias experiências, em minha própria análise. Mas posso eu confiar em minha experiência, meu julgamento, minha análise? Minha experiência é o resultado de meu condicionamento, não é? Eu posso ter sido criado como muçulmano ou budista ou hindu, e minha experiência dependerá de minha base cultural, econômica, social e religiosa, assim como a sua. E posso eu confiar nisso? Posso confiar como meu guia, como esperança, como a visão que me dará fé em meu próprio julgamento, que novamente é o resultado de memórias acumuladas, experiências, o condicionamento do passado se encontrando com o presente? Ora, quando me fiz todas estas perguntas e estou consciente deste problema, vejo que só pode haver um estado no qual realidade, inovação, pode surgir, que gera uma revolução. Esse estado existe quando a mente está completamente vazia do passado, quando não existe analista, nem experiência, nem julgamento, nem autoridade de qualquer tipo.
J. Krishnamurti – O Livro da Vida
A autoconsciência é trabalhosa, e desde que a maioria de nós prefere um modo fácil, ilusório, nós criamos a autoridade que dá forma e padrão à nossa vida. Esta autoridade pode ser o coletivo, o Estado; ou pode ser o pessoal, o Mestre, o salvador, o guru. A autoridade de qualquer espécie é ofuscante, ela traz negligência; e como a maioria de nós considera que ser reflexivo é ter dor, nos entregamos à autoridade. A autoridade engendra poder, e o poder sempre se torna centralizador e, portanto, completamente corruptor; ele corrompe não só o manipulador do poder, mas também aquele que o segue. A autoridade do conhecimento e da experiência é perversora, esteja investida no Mestre, seu representante ou o sacerdote. É sua própria vida, este conflito aparentemente infindável, que é significativa, e não o padrão ou o líder. A autoridade do Mestre e o sacerdote afastam você do ponto central, que é o conflito dentro de você mesmo.
J. Krishnamurti – O Livro da Vida
Não existe método para o autoconhecimento. Buscar um método invariavelmente implica o desejo de conseguir algum resultado e é isso que todos nós queremos. Seguimos a autoridade – se não aquela de uma pessoa, então a de um sistema, de uma ideologia – porque queremos um resultado que será satisfatório, que nos dará segurança. Nós, realmente, não queremos compreender a nós mesmos, nossos impulsos e reações, todo o processo de nosso pensar, o consciente bem como o inconsciente; queremos antes buscar um sistema que nos assegure um resultado. Mas a busca de um sistema é, invariavelmente, resultado de nosso desejo de segurança, de certeza, e o resultado é, obviamente, não a compreensão de si mesmo. Quando seguimos um método, devemos ter autoridades – o professor, o guru, o salvador, o Mestre – que nos garantirão o que desejamos; e esse, certamente, não é o caminho para o autoconhecimento, não é? Sob o abrigo de uma autoridade, um guia, você pode ter, temporariamente, uma sensação de segurança, uma sensação de bem estar, mas isso não é a compreensão do processo total de você mesmo. A autoridade, em sua própria natureza, impede a integral consciência de si mesmo e, assim, finalmente destrói a liberdade; só na liberdade pode haver criatividade. Só pode haver criatividade através do autoconhecimento.
J. Krishnamurti – O Livro da Vida